Memórias de um velho banco de madeira – 5º Capítulo – A Arbo Nu e a Ponte

  Memórias de um velho banco de madeira

  A Arbo Nu e a Ponte

Depois de muito tempo, eu começo a entender melhor, agora, o drama da espécie humana. Vejo e sinto através daqueles que por aqui passam e se sentam neste velho banco de madeira, que a cada dia que se passa, novidades e mais novidades são trazidas à tona envolvendo tecnologias, bem estar social, melhor qualidade de vida, saúde e longevidade.
Tudo isto parece trazer mais alegria e felicidade. Só parece! Pois na mesma proporção que estes avanços acontecem, a necessidade de busca a alívios e até mesmo fugas acorrem de forma mais intensa ainda. Tenho notado através das impressões deixadas aqui, que as pessoas buscam mais orientações e conselhos, recorrendo a mestres e gurus e, estão dispostas até mesmo, a mudanças extremas em face a estados aflitivos cada vez mais frequentes acontecendo em suas vidas. Isto é muito evidente em meio às conversas e memórias, travadas e deixadas aqui frequentemente. Estou sobrecarregado de tantos acontecimentos pesarosos e isto me deixa, às vezes, entediado e aborrecido. Os dias se passam e, escasseiam-se acontecimentos que me produzem euforias. Estes últimos dias têm sido dessa forma, monótonos e sem novidades.
Epa! Epa!  Parece que me antecipei prematuramente! Algo está ocorrendo ali na curva desta trilha: Uma espécie de redemoinho de folhas e, um retorcer de galhos e caules de árvores em meio a um espectro em precipitação sem definição entre luz e sombra. E, espere! Algo começa a se precipitar e tomar forma entre uma simbiose luminosa. Sem dúvida é uma interferência de outro mundo, neste mundo e, causaria um arrepiar e uma correria em qualquer ser humano, pois carrega em si, um aspecto nitidamente fantasmagórico.

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Uma forma indefinida, perdida entre uma luz sem reflexo e sem brilho lúcido, se movimenta em sincronia a uma sonoridade que se inicia já de forma a criar arrebatamento. Oh! Não! Vem em minha direção, lenta, mas envolvida em um bailar suave e ligeiro, no embalo desta música que contagia. Pronto! Chegou mais perto de mim e me envolve em um movimento que nunca imaginei e experimentei antes. Oh!  É uma criatura espetacularmente linda, revestida  de uma indumentária incomum, indescritivelmente fora dos padrões conhecidos pela espécie humana.
Movimenta-se   em uma onda luminosa que flutua em um bailado frenético… Envolve-me, me arrasta e me dobra como se eu fosse todo de borracha! Estou dançando, perdidamente inebriado neste embalo contagiante, mergulhado por inteiro neste frenesi alucinante! Não tenho forças para recusa, nem mesmo para gritar, pare.  Mas o que é isto? Não é humana e não tenho a menor ideia do que seja. Como pode, um banco de madeira dançar? Será que estou sendo acometido daquilo que os humanos definem como loucura? Mas, que loucura maravilhosa! Estou dançando mesmo!  Envolvido nisto que não sei definir o que é! Oh! É o que se pode achar como uma alucinação sem caracterização, mas um momento linear no tempo das lembranças que permanecem sempre vivas. Deliciosamente contagiante! Impossível  de dizer um basta.  Não há como descrever o que ocorre com este velho banco de madeira aqui neste parque. Não há nenhuma testemunha, até porque não haveria como se acreditar. Não poderia fugir disto, mesmo que eu quisesse. Esta criatura não pára e não esboça nenhum sinal de que não nos reconhece em um estado alheio ao normal, vergonhoso aos padrões normais. Continua a bailar! E, eu também! Estou envolvido em uma atmosfera de uma alegria incontida. Não quero que pare! Quero continuar! Estou louco! Louco! Louco! Mas uma loucura deliciosa.
De repente parou o som desta alucinante salsa cubana. Até que enfim!

 

O contato

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Sentou-se despojadamente neste banco. E agora? Mesmo sentada aqui, nada sei  sobre ela, pois não há registro nenhum de suas memórias! Esquisito, pois isto não é normal alguém se sentar aqui sem que, de imediato, eu absorva suas memórias! Não acontece com esta criatura! Quem será? Ou, o que será isto?
Espere! Está mudando de fisionomia. Seu aspecto de criatura angelical ou mesmo alienígena está sendo removido, mas suas memórias se mantém enclausuradas em uma cortina de névoa para não serem conhecidas. Está claro para mim, que não é um ser deste planeta. Tampouco não parece definitivamente um anjo, apesar de ter aparência de anjo muito diferente do que se caracteriza como anjo.
Esta experiência que estou tendo não faz parte dos acontecimentos aos quais estou habituado. Já houveram registros de pessoas que deixaram suas memórias aqui  e, que falaram de coisas similares. Porém não tenho registro de ninguém que tenha vivenciado o que estou experimentando aqui. Sou o único a testemunhar esse tipo de evento.
Oh! Sua aparência inicial desapareceu e agora se parece com uma pessoa normal, apesar de manter traços fisionômicos de uma beleza sem igual.
– Olá!
Está falando comigo? Perguntou estupefato  o banco.
– Sim! Com você!
Não! Não é possível! Ninguém pode falar comigo! A não ser que esta seja uma ação especial, fora do habitual! Completou o banco.
– É especial! Estou me comunicando com você e esta é uma ação muito especial!
Mas, como é  possível, eu não fui concebido para me comunicar com ninguém! Ninguém mesmo! Ressaltou o banco.
– Sim, com ninguém! Apenas comigo nesta ação especial.
Se estou tendo o privilégio de me comunicar com você, prepare-se, pois serão muitas as minhas perguntas e a curiosidade é enorme!  A lista é bem grande! Complementou o banco.
– Calma! Calma! Vai haver tempo para tudo! O pouco tempo que vou passar por aqui é suficiente para você entender. 
Quem é você?  De onde vens? O faz aqui? E principalmente, o que é você?
– Ora, uma coisa de cada vez!
-Primeiro me deixe descansar um pouco, pois tanto quanto você, eu também estou cansado e curioso deste mundo dos humanos! Como estou me assumindo como humano, nesta ação, passo a sentir os efeitos densos da espécie humana. 
– Sou um viajante pelo cosmo afora. Viajo por distâncias inconcebíveis para a mente dos humanos, mas nunca me deparei com a situação de “cansar”. Isto não existe para mim, pois sou energia, uma parte da Fonte e, o comportamento de energia é imutável. Mas, estou em uma missão e me foi concebido, uma única vez, o direito de me tornar humano por pouco tempo. Estou maravilhado e surpreso com a diversidade, beleza e, também com a dor da raça humana. Ela é única em meio a numerosas outras raças em todo o universo. Como lidam com tantas dificuldades e, como é grande a fragilidade de sua espécie. Por esta razão, estou compartilhando, por apenas alguns minutos, da experiência desta raça que é muito curiosa e criativa. Quero aprender um pouco desta reconhecida riqueza.
No meio de tanto caos e destroços desta espécie, há verdadeiras maravilhas. Há verdadeiros anjos e também demônios  entre esta espécie.  Ela é muito bruta, carente, ingênua, inconsequente, mas sobretudo tem um poder criativo enorme e único. Trago um registro de memória que é o teor desta minha missão. Você só vai saber de mim, aquilo que está relacionado com a experiência  de “um ser humano notável” que é a razão de eu estar aqui neste planeta, nesta missão especial.

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Dito isto, levantou-se do velho banco de madeira e foi se envolvendo em um redemoinho de luz descido junto com nuvens de uma beleza indescritível e, retomou seu aspecto original envolvido em um cenário que só poderia ser parte do celestial. Espetáculo de outro mundo, sem dúvida! Desta vez se envolve, sozinho,  em um bailado com todos os acordes de uma música da época de ouro que tanto empolgou os seres humanos. “O Esplendor do Amor”. Fragmento inesquecível de um  tempo em que a mente humana passou por uma incrível mudança. O século das artes, do amor, da criatividade, das revoluções e da discórdia.
Que acontecimento extraordinário este que estou presenciando. Nunca mais serei o mesmo velho banco de madeira que só tem servido para acomodar o traseiro de pessoas que por aqui passam e se sentam. Agora sou mais que uma coisa qualquer. Reconheço-me como  parte de algo grandioso! Sou um privilegiado!
A criatura virou-se para o banco de madeira, sorriu e disse: Adeus! Vou sentir saudades deste mundo, principalmente dos sentimentos mais nobres e marcantes dos seres humanos como “alegria, o amor e a compaixão” que esta espécie guarda com tanto ardor e fervor em meio a tanta dor e clamor.

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O rufar dos tambores, o crepitar das armas  em meio aos clamores de inocentes, juntos ao ribombar dos canhões em fúria pelo mundo e, a rotina das metrópoles abarrotadas de almas em chagas, tudo  está silenciado neste glorioso e nobre momento de luz e paz, mesmo que tenha ocorrido em apenas uns poucos minutos.
Partiu como se estivesse carregando em seus braços, tábuas e pedaços de madeira deste velho banco, deixando-me como um órfão carente, vazio e saudoso  em meu próprio chão. Resíduos de lampejos luminosos de sua partida envolveram plantas e árvores de toda esta parte do parque. Uma luminescência rosada se esparramou pelo chão como se fosse um tapete de cores celestiais em festa para o desfile de  deuses. Foi um momento mais do que especial, pois a magnitude deste evento anômalo superou em muito, todas as possibilidades de um cortejo mágico. Glorioso! Glorioso!
O que aconteceu aqui não foi apenas um contato. Foi a intersecção de algo maravilhoso, cheio de esplendor, surpresa e doçura. Um ar de puro amor, fé e esperança de um mundo longínquo, porém tão perto da raça humana foi o que se projetou aqui. Não foi apenas uma Entidade Elevada ou um ser superior de um outro mundo que aqui esteve. Foi algo maior, bem maior, que veio deixar aqui uma impressão sólida de uma sublimidade inigualável, que aguarda se depositar no coração humano. A raça humana nunca esteve só. Ela sempre esteve acompanhada de uma beleza celestial que acompanha toda a trajetória de vida de cada um. Só precisa ser visto com o olhar do coração, aquele desprovido dos conceitos avariados, das vaidades e dos apegos aos tesouros fugazes que nada valem. O ser humano é Divino e Imortal.  Está apenas preso aos fardos da materialidade e, mesmo em vida pode perceber e sentir esta grandeza que há em toda parte.
Estou sem palavras. Este velho banco de madeira jamais será o mesmo. Todos os resquícios de memórias anuviadas, nocivas e angustiantes deixadas aqui por ingênuos e tolos serão riscadas pelo lampejo cintilante desta entidade que ficou aqui por poucos minutos. Estou em estado de graça. Os dois momentos marcantes que ocorreram aqui mudaram os conceitos sobre tudo o que eu recebi e acumulei em forma de memórias ao longo de tantos e tantos anos.
Não tenho perguntas e todas as minhas curiosidades cessaram. A música que me sacudiu e me contagiou, fez me compreender melhor, que mesmo em meio a dor e o sofrimento, o ser humano é capaz de produzir alegrias, festejos e criar encanto para o seu coração ferido. Os humanos são pura arte e mistério. A presença desta criatura dos Altos aqui, junto comigo, me trouxe uma compreensão melhor da extensão do sagrado que há entre o mundo material e o não material.  A cortina que separa estes dois universos é a maior glória a ser alcançada e aberta livremente, um dia, pela espécie humana. Deve ser atingida sem medo e temor e, de forma natural por etapas de ações positivas, pois é grandiosa a sua beleza e suas benesses assim como todo o universo.
O mundo tem acontecimentos que se desenrolam fora do alcance e da visão humana, por uma razão providencial, certamente. Nenhuma parte deste parque seria, como continuará a ser agora, se a espécie humana tivesse visto, vivenciado e sentido o que senti  e vivenciei aqui. Com certeza tudo isto aqui se transformaria em um local de peregrinação onde todo tipo de pensamentos e manifestações, até mesmo loucuras desenfreadas ocorreriam, abrindo frestas profundas na conceituação das coisas que envolvem o sagrado e o demoníaco. A Providência é justa e sabe se manifestar coerentemente entre as peças do tabuleiro da vida e da existência. O que aconteceu aqui vai ficar sepultado silenciosamente, aguardando o que a própria Providência tem guardado para mim um dia.
Não há nada mais a expressar. Apenas, tão somente atender ao meu ímpeto de deixar fluir em transbordamento, o belíssimo relato memorial de uma pessoa que por aqui nunca passou, mas que através desta enigmática e surpreendente entidade tive a grata benção de conhecê-lo e, me maravilhar com sua grandeza. É singular e memorável a sua trajetória.
Vejamos como tudo começa:

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Estamos em uma tarde luminosa com os últimos raios de sol delineando as curvas dos sobrados antigos com telhados em Chanel, parecendo um bailado suave sob o delicioso som do “Smoke Gets”. Não há mais vestígios dos bombardeios durante a sangrenta guerra que ocorreu neste lugar. Parte da cidade velha e das vilas dos criadores de ovelhas ali perto ainda são as mesmas que antes do conflito. Estamos em uma rua estreita de Podgorica, capital de Montenegro, província da antiga federação da Iugoslávia. Há uma charmosa lojinha de souvenires e cafeteria, que nesta hora da tarde está repleta de pessoas alegres e, bonitas por sinal. Entre os ocupantes das mesas e cadeiras que avançam pelas calçadas, lá se encontra um simpático jovem trajando um jeans azul e uma camisa marrom xadrez com um severo ar cosmopolita que chega a chamar à atenção de quem está por perto. Acaba de pagar à atendente, o café que lhe fora servido com muita simpatia e apreço e, se retira dali. Ao atravessar a rua passou em frente a uma loja de roupas femininas muito bem cuidada e decorada, com o cuidado de não ser reconhecido, pois aquela loja fora um presente que dera a uma sua amiga muito querida em retribuição a uma amizade colegial antiga e sólida, iniciada na cidade de Nova York quando os dois estiveram juntos na universidade. Ele um americano da mesma cidade, filho de imigrantes iugoslavos e ela uma cidadã de Montenegro agora vivendo em seu país de origem.
Deixou a avenida dos bulevares e entrou na Rua Kralja Nikole, início da sua jornada. Andou poucos metros e pegou um transporte para uma pequena cidade perto da fronteira com a Servia. Lá chegando pediu informações ao pessoal que encontrou no seu trajeto. Queria saber como chegar à trilha que levaria ao topo da famosa montanhas que era o ponto final de uma peregrinação feita todos os anos por europeus nesta mesma época do ano. Depois que obteve as informações sobre a trilha, pontos de parada e restaurantes, deu início à sua caminhada. Antes porém, alguém que estava ali perto perguntou seu nome e ele respondeu: Meu nome é Milo! Estou me orientando sobre a trilha para chegar ao alto da montanha na fronteira. O caminho para chegar até a Arbo Nu. Teve muita sorte, pois a única pessoa que lhe perguntou o nome,  era também a única da região que conhecia o caminho até a Arbo Nu. A Arbo Nu? Retrucou o senhor presente! E, completou: Nós dois somos os únicos a ouvir   falar deste nome. Ninguém mais sabe nada sobre ele. Este senhor que lhe dera todas as orientações de como alcançar o lugar parecia saber mais sobre a Arbo Nu do que demonstrava à primeira vista.
Milo estava para começar, de fato, a sua jornada exatamente aqui. Mas, já era noite e não podia seguir adiante. Precisava encontrar um abrigo ali naquela pequena vila formada por uma dezena de casas em meio a uma única rua ao lado de  um denso bosque de pinheiros negros. Outra vez recorreu ao mesmo senhor que lhe dera as orientações e fora este mesmo que muito gentilmente se ofereceu para abrigá-lo  em sua modesta casa.
O senhor lhe ofereceu um local para tomar um banho e, depois um jantar saboreado com muito gosto e apreço. Depois, uma taça de vinho e uma conversa inteligente e muito agradável avançou pela noite adentro até quase a madrugada. Milo não conseguia esconder sua admiração e curiosidade sobre aquele senhor, pois o mesmo era conhecedor de muitas coisas do mundo, assim como o Milo. Muito educadamente procurou saber alguma coisa sobre a Arbo Nu. Seu anfitrião foi enfático e não quis lhe adiantar nada. Apenas recomendou não desistir da buscá-la, pois ia lhe valer muito a pena. Encerrada aquela conversa tão interessante Milo foi descansar. Consegui dormir por apenas umas poucas horas.

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Aos primeiros raios do sol, Milo despediu-se do seu anfitrião e deu início à sua aventura. Sua cabeça já carregada de tantas dúvidas, mais ainda ficara depois de encontrar aquele senhor. Como poderia ele, sendo um homem do campo, do interior e nunca ter viajado saber tanto sobre ciências, filosofia, arte e, mais ainda, línguas ? Alguma coisa não estava clara. Suas dúvidas já grandes, aumentavam mais ainda. Outra questão em aberto: Como poderia ele saber da minha chegada, da minha determinação em fazer esta jornada ? E, mais ainda, como poderia me orientar com tamanha segurança sobre um caminho do qual ele nunca percorreu ? Quem era ele? Não sei! Minha cabeça parece que vai explodir de tantas perguntas.
Ele me dissera ainda, que apesar dos perigos que vou encontrar, eu vou estar sempre acompanhado nesta jornada espiritual. Ora! Eu não vou fazer nenhuma jornada espiritual! Eu estou fugindo do caos do mundo, das multidões e das redes sociais. Busco aliviar a pressão e o conteúdo enojado da minha cabeça que está inundada de acontecimentos dolorosos do mundo. Estou fazendo apenas uma peregrinação como tantas outras pessoas o fazem. Não quero companhia! Quero estar sozinho! Busco apenas paz e um equilíbrio emocional!
Iniciou sua caminhada por uma trilha estreita e inicialmente pedregosa que logo em seguida foi se tornando suavizada, fundindo-se à exuberante floresta.

Tinha um bom par de tênis, roupas arejadas e carregava uma mochila nas costas. Bem! Não carregava só uma mochila. Carregava também agora, um volume grande debaixo dos braços e uma bolsa. Era uma coberta e comida desidratada que lhe foram ofertadas pelo anfitrião.
Poucos minutos de caminhada e lá estava no chão, a primeira evidência real de sua jornada: Eram penas! Isso mesmo! Penas de aves! Algumas enormes, outras grandes e várias pequenas. Recolheu-as em um feixe com o cuidado de não deixar nenhuma para trás conforme lhe orientou o seu amigo lá atrás. Assim o fez, aguçando a sua primeira curiosidade: Porque devo recolher penas nesta jornada? O anfitrião me dissera que seriam de uma enorme valia. Seria para serem vendidas e levantar recursos para a jornada? Não sei! A propósito, tenho recursos para tal aventura e não vou precisar vender penas.
A sua caminhada demoraria de cinco a seis dias dependendo do bom ou mau tempo. Passaria por caminhos estreitos, campinas, florestas densas, rios, riachos, subidas e descidas em morros e montanhas e, trilhas escarpadas e íngremes. Encontraria também, vilarejos, fazendas, sítios e campos desertos. Certamente encontraria também, pessoas.
Cada passo que dava, uma lembrança viva se sobressaia com descortinamento doloroso de momentos impactantes. Estivera na linha de frente de missões da ONU em ajuda humanitária na guerra da Síria. Vira de perto o cair do alto, bombas e morteiros ceifando e dilacerando vidas e mais vidas.
Em cada atendimento como assistente médico, suas mãos estavam sempre sujas de sangue, seu coração sangrava e seus olhos não davam tréguas a tantas lágrimas. Não dormia sem que sonhasse com crianças e civis em seus braços ensanguentados gritando de dor.
Tinha uma repulsa insistente pelo ser humano, mas ao mesmo tempo, um profundo sentimento adormecido de compaixão e de impotência diante do mundo.
Não sabia como digerir tamanho dissabor pela vida. Agora que estava distante deste palco horroroso, sentia-se um pouco confortado diante deste cenário silencioso. Pelo menos não estava vendo corpos espalhados a sua frente.

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Estivera já caminhando por quase três horas e se sentia cansado. Parou debaixo de uma árvore que parecia sagrada ao lado da trilha, e se sentou sobre um velho tronco de madeira, banhado pelos intermitentes raios do sol que se movimentavam criando sombras dançantes no chão e na vegetação baixa e rasteira daquele ponto de parada. Seus pensamentos, agora, vagavam pelas ruas da Cidade de Nova York quando estivera acompanhando uma comitiva de especialistas em meio ambiente indo em direção ao prédio das Nações Unidas para a conferência anual.
Lembrou-se de que, ao retornar da Síria depois que fora ferido em um bombardeio quando socorria feridos na guerra, procurou um amigo na cidade de Nova York muito conhecido pelos conselhos e orientações que dava às pessoas que o procuravam. Depois de se inteirar por completo do seu estado emocional, o amigo lhe recomendara se afastar das cidades, dos amigos e das redes sociais  e, procurar refúgio em um lugar longínquo, nas montanhas de Montenegro. Lá ele encontraria paz e recomporia a sua estrutura emocional devastada pelas experiências que tivera. Lá estaria a sua Arbo Nu. A síntese da sua vida e de sua paz. Agora já estava à caminho deste lugar que se constituía em uma meta inadiável a ser alcançada.
Não sabia nada sobre esta Arbo Nu, mas queria encontrá-la a qualquer custo.
Repentinamente, nem bem direito se acomodara sobre o tronco de madeira, quando ouviu um barulho de folhas secas sendo remexidas atrás de si. Saltou para frente como se tivesse sido puxado ou empurrado por alguém ou alguma coisa, caindo no chão pedregoso arranhando o seu braço esquerdo descoberto e suas pernas.

Viu ao lado daquele tronco velho, uma serpente enorme que havia dado um bote em seu braço, mas que felizmente não o acertara. Por pouco a sua jornada não terminaria ali, naquele local. Sentira que fora salvo por alguma coisa que o puxara ou o empurrara para frente no exato momento da investida da serpente. Recolheu as suas coisas e rapidamente se afastou dali. A aceleração das batidas do seu coração demorou um pouco a voltar ao normal.
Sendo um homem sem nenhuma crença religiosa, não fora capaz de externar nem sequer um simples agradecimento pela sua vida ser salva naquele momento. Lembrou-se, no entanto, de que havia em sua mochila, uma pequena ampola de gás de pimenta recolhida no meio de uma multidão que se manifestara contra uma medida impopular do governo Frances, em Paris. Teve um pouco de dificuldade em localizar esta pequena relíquia em sua mochila, mas ao encontrá-la, retirou a tampa e atirou a cápsula com o gás onde estava a serpente. Imediatamente o odor se espalhou e a serpente fugiu apressada.

Andou mais um pouco até encontrar um lugar seguro para descansar. Aquela região montanhosa era muito quente nesta época do ano. Era verão.
Depois de meia hora de descanso, recolheu as suas coisas e continuou a caminhar. Tantas coisas se passavam na sua cabeça, que era difícil selecionar aquilo que poderia ter algum proveito. Adiante, encontrou novamente no chão, uma outra porção de penas espalhadas na trilha e, uma indagação brotou repentinamente:
Como teriam aparecido aqui? Parece até que foram colocadas aqui de propósito. Recolheu-as todas com a mesma atenção da vez anterior e seguiu viagem.
Visualizou mais a sua frente, um banco de madeira que parecia ser mais seguro e um ponto ideal para um momento de contemplação, pois havia em frente, uma espetacular paisagem com um precipício que se fundia com o horizonte verde azul.
Sentou-se ali e se lembrou de quando tinha uma família que, sentados todos juntos na varanda da casa, contemplavam as montanhas azuladas de sua terra natal. Não conseguiu conter uma lágrima que escorrera de sua face suada.
Sentia saudades de sua ex-esposa e de sua linda filha Sofia. Estava divorciado em vista de estar sempre ausente da família.
Era um homem versátil em ciências e comunicações, sendo por esta razão, requisitado para dar palestras em toda parte. Passou quase toda sua vida viajando pelo mundo todo.

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Olhou para o caminho a sua frente ao ser percorrido durante a tarde e, surpreso viu algo se movendo a uma certa distância. Aquilo foi se aproximando e ao chegar perto, uma surpresa desagradável: Era um pequeno cão com uma aparência horrível. Tinha um focinho enorme inchado que lhe cobria os olhos dificultando-lhe a visão. Levantou-se com um certo receio e o pobre animal caiu ali na sua frente. Estava morrendo, talvez! Milo verificou que aquele cachorro havia sido mordido no focinho por uma cobra e, lamentou não poder fazer nada. Ficou compadecido e ia se retirando dali, quando parece ter ouvido uma voz que dizia: Não se vá! Olhou para todos os lados e não viu ninguém. Parece que naquela hora Algo Providencial tramava uma ação inesperada. Lembrou-se de que quando estivera na África presenciou algo parecido e, acabou guardando, como lembrança, um soro antiofídico com uma minúscula seringa. Remexeu sua mochila e acabou encontrando o soro e a seringa. Voltou-se para o cão e verificou que o mesmo ainda respirava. Não perdeu tempo e lhe aplicou o soro. O animal estava tão fragilizado que não sentiu a picada da seringa. Milo ficou ali olhando para o animal moribundo por alguns minutos. Estava compadecido. Viu que não podia fazer mais nada.  Juntou algumas folhas juntamente com algumas das penas que carregava no feixe e fez uma caminha fora da trilha para acomodar o animal. Pegou com cuidado aquela criatura, colocando-a naquele improvisado ninho e foi embora, pesaroso. O fim da tarde passava rápido e a noitinha já se adiantara, apressada. Lá na frente viu uma pequena casa no caminho e decidiu pedir abrigo para aquela noite. Teve sorte em conseguir abrigo naquele lugar.  Apesar de serem pobres aquelas pessoas que viviam naquela casa, não lhe foi recusado o abrigo. Alojou-se em um precário galpão que bem antes era usado para guardar máquinas usadas na agricultura. A noite esfriara bastante e a coberta que carregava lhe foi muito útil. Dormiu e ao acordar, de manhã, lembrou-se do cão lá atrás e resolveu voltar pára enterrá-lo, pois tinha certeza que estava morto.
Chegando lá, viu surpreso, que o animal estava vivo e que o seu focinho havia desinchado. Parecia estar em fase de se recuperar. Ficou surpreso e recolheu de volta as penas ali do chão. Pegou aquele animalzinho nos braços e levou até a casa das pessoas que lhe dera abrigo. As pessoas ficaram contentes pois o cão era deles e estava desaparecido há alguns dias. Agradeceram-se mutuamente e o Milo partiu. Ele era muito esperto e começou a desconfiar de que estava sendo acompanhado por alguma coisa ou alguém que o ajudava. O seu íntimo desfrutava de um certo conforto e havia em seu semblante, traços claros de luminosidade e paz. Ele entendia e era conhecedor de muitas coisas, mas aquilo que estava experimentando lhe deixava confuso. O seu primeiro dia havia sido cheio de acontecimentos inesperados e, outros dias lhe aguardavam com outras surpresas.
Caminhando agora por uma trilha onde haviam pessoas circulando e animais pastando em campos verdejantes, viu logo a sua frente uma pequena vila com apenas uma rua por onde andavam umas poucas pessoas indo e vindo. Um pequeno prédio antigo com apenas um andar e um letreiro grande que dizia “Banco” lhe chamou a atenção. Viu algumas pessoas em uma fila e decidiu fazer parte dela para retirar algum dinheiro de sua conta para a jornada. Logo atrás, uma moça linda com uma pequena mala nas mãos lhe perguntou se naquele banco ela poderia sacar algum dinheiro. Milo respondeu que se ela tivesse uma conta com saldo, certamente poderia sacá-lo. Ela ficou em silêncio e ele também. Ele entrou, sacou uma certa quantia e ao sair viu que a jovem permanecia ali do lado de fora. Milo perguntou por que ela não entrou no banco. Ela respondeu que não tinha conta e nem dinheiro e, completou : Moço! Eu estou indo à capital vender alguns livros, pois estou precisando de dinheiro para comprar comida para mim e minhas irmãs. Milo perguntou: Onde estão os livros? Ela respondeu: Moço! Na verdade eu não tenho sequer um livro. Estou indo embora deste lugar, pois aqui não posso cuidar de mim nem de minhas irmãs. Talvez na capital eu consiga um trabalho. Estamos todas passando necessidade e temos fome. Milo perguntou mais uma vez: Como você espera chegar até a capital? Ela respondeu que iria andando até chegar lá. Milo respondeu que era muito longe para se chegar lá andando e, completou: Onde estão suas irmãs? Ela respondeu: Estão logo ali! Ambos foram até as meninas e de fato eram crianças envolvidas em necessidades. Estava bem visível a situação. Milo levou as três até um mercadinho que havia na vila e fez uma boa compra em alimentos para todas. Demonstraram muita alegria com o gesto daquele moço, chegando até mesmo a chorar de emoção e gratidão. Milo foi se afastando delas quando a jovem lhe disse o seguinte:

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– Moço! Você não gostaria de me acompanhar até a capital? Eu farei qualquer coisa para agradar você. Milo sacudiu por inteiro o seu interior e encontrou o aríete da moral, da ética e da decência armados e, prontamente respondeu: Não! Não posso! Tenho uma missão a cumprir. Compreendeu de imediato que estava diante de uma situação embaraçosa, constrangedora e que apresentava perigo. Retirou de sua mochila um bloco de anotações e escreveu um bilhete à sua conhecida lá da loja da capital. Deu um jeito de deixar o bilhete selado e lacrado. Tirou de sua carteira um dinheiro e entregou à jovem, recomendando-lhe que procurasse, na capital, a jovem cujo nome estava escrito no bilhete juntamente com o endereço. A jovem muito sentida lhe agradeceu com os olhos cheios de lágrimas. No bilhete Milo pedia à sua amiga que abrigasse, desse amparo e trabalho à jovem, tratando-a como se fosse a sua filha. Tinha certeza de que seria atendido. De alguma forma, algo lhe impulsionara a agir com tamanha bondade. Já era  de sua natureza agir com benevolência, só que desta vez, a ação era mais forte e mais determinada.
Ouviu, novamente, a voz que lhe dissera: Agora vamos embora! Elas estarão todas protegidas, por enquanto!
Milo indagou, junto a um senhor que estava ali perto, se conhecia aquela moça e as irmãs dela: O senhor lhe respondera:
Sim! Eu as conheço! São todas pessoas boas  e estão passando por dificuldades assim como todos nós desta vila. Completou dizendo que há, em uma vila perto dalí, um convento que dá abrigo a crianças desamparadas.
Só falta alguém tomar a iniciativa de encaminhá-las até lá. Outra vez a voz lhe sussurrou baixinho no ouvido: Milo! Vamos embora! As três estão protegidas agora!

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Milo achou então, que estava sendo afetado por algum distúrbio de consciência e não deu importância ao que achava ter ouvido. Formulou um pensamento elevado de amparo e proteção as três e continuou com a sua caminhada, só que perturbado com o que presenciara. Abriu o seu leque de indagações contradizentes sobre crenças. Sou um agnóstico ateu com convicção e não consigo reter o meu desagravo. Indagou com um ar severo de desapontamento: Como pode existir, como dizem os religiosos, um deus que dá proteção e amparo aos seres humanos, classificando-os como seus filhos, enquanto vagam por este mundo caótico, pessoas completamente desamparadas e desprotegidas? Vi tantos com tanto e, tantos mais sem nada! Que pai é este que se comporta assim? Não é um pai. Deus é apenas uma criação inventada para dar suporte à  fraqueza humana que não se justifica.
Reluto em aceitar, mas as minhas convicções, ultimamente têm sofrido um abalo, mesmo ao meu contragosto. Resisto em concordar em desenvolver um raciocínio mais nobre e racional sobre a existência do sagrado. Mas, algumas pontadas, às vezes me cutucam com insistência. Fazem-me ocorrer que há no nosso interior, uma indicação que aponta para a existência de algo não biológico. Imagino uma espécie de central onde são processadas decisões de caráter biológico e não biológico. Há mais alguma coisa que está acima da consciência e mesmo da subconsciência que clama por crença e fé. Não conheço nada deste campo, mas há uma clara indicação da existência de algo que ressoa em um nível sutil e mesmo muito sutil. Dizem que fragmentos de reflexos quando são muito insistentes produzem sofrimentos mentais e físicos. É verdade, pois a lembrança vive da moça lá atrás com suas irmãs me deixou aborrecido e pesaroso. Podiam ser minhas filhas! Neste instante, uma lágrima quente e dolorida riscou o meu semblante já triste. Continuou sua jornada indagando se o que estava fazendo tão longe do seu mundo tinha algum sentido!
Andou e andou com aquele tormento mental por um tempo até que visualizou mais uma vez, penas e mais penas espalhadas na trilha. Parou e pensou não mais recolhê-las. Aí, outra vez a voz lhe disse? Recolha-as!
Milo recolheu-as todas, em um silêncio constrangedor e continuou a caminhar.
Aquele seu segundo dia de jornada estava bem cheio de acontecimentos não prazerosos.
A tarde chegou trazendo uma brisa carregada de essência de flores silvestres dos campos lá embaixo. Uma prazerosa nuvem de moléculas perfumadas se espalhava por ali. As primeiras estrelas começam a despontar naquela que seria uma noite escura a ser passada ao relento. Não se preocupara em buscar um abrigo. Sentou-se no topo da montanha escarpada e viu, lá bem longe, a cidade de Podgorica minúscula inundada pela iluminação noturna. Contemplou o horizonte mesclado de cores que variavam do vermelho ao amarelo e, do azul ao negro da noite. Tudo estava riscado de aves que retornavam aos seus ninhos e recantos nas florestas, voando em formações precisas, calculadas e bem desenhadas. De repente viu as luzes se apagando em partes da cidade, até que ficou quase tudo às escuras. Era um blackout! Ficaram apenas pequenas partes com uma iluminação tênue que foram cessando aos poucos. Lembrou-se das aulas que tivera na universidade onde eram explicados os momentos finais das atividades do cérebro humano quando cessa a vida. Percebeu que nas partes da cidade escura onde ainda tinha iluminação, ali haviam atividades físicas normais. Para o Milo, as experiências pós morte, quando o paciente retorna à vida, nada mais são do que reflexos ativos das crenças de cada um. É exatamente como ocorre com a iluminação de uma cidade como agora estou presenciando. São atividades da dinâmica da existência e nada mais. Segundo se sabe, os indianos ao cremarem seus mortos estão agindo corretamente. Os cristãos e outros povos enterram seus mortos, alguns ainda vivos com chance de retornarem à vida. Neste instante, aquela voz que já lhe é conhecida murmurou: Hum! Hum!
Milo foi um privilegiado em dormir ao relento em uma noite apenas fresca sob uma coberta abarrotada de estrelas brilhando silenciosamente. Dormiu em paz!

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No dia seguinte, logo pela manhã, fez uma refeição leve com o que dispunha e seguiu viagem. Parava de vez em quando para continuar recolhendo penas no caminho e perguntava a si próprio como e quando encontraria a Arbo Nu, a tão cobiçada relíquia que lhe fora orientado a buscá-la com tanta insistência. Outra vez a voz lhe dizia: Siga em frente!
Seu dia começara atravessando uma plantação de flores de lavanda, destroçada e abandonada, talvez em função de uma seca que assolava a região. O que restava da plantação, àquela hora, exalava um perfume forte da lavanda que chegava a inebriar os sentidos. Viu a sua frente, uma cena  incomum a um homem da cidade. Um cavalo! Isso mesmo! Um cavalo andando em círculo com a visão centrada em alguma coisa. Milo se aproximou e viu do que se tratava: Era um poço d’água que o cavalo insistia em alcançá-la para matar a sua sede. Impossível para o cavalo alcançar, pois a lâmina de água estava funda e o cavalo não a alcançaria de jeito nenhum. Milo ficou impaciente, não sabendo como ajudar a matar a sede daquela animal desesperado. Sabia que, se o cavalo caísse no poço, não teria como sair e morreria ali, afogado. Lembrou-se de que tinha na sua mochila, um boné de uma marca famosa que guardara como lembrança. Não pensou duas vezes e pegou o boné sem relutar. Desceu várias vezes no poço com muita dificuldade e retirou no seu boné a água para saciar a sede do cavalo. Não parou de repetir a descida até que o animal se fartou. O seu boné ficou todo deformado, mas não o atirou fora. Olhou para o cavalo, compassivo e deixou cair uma lágrima de compaixão. O cavalo o seguiu por quase meia hora até um outro local mais adiante, onde havia pasto verde e um riacho com águas límpidas.
O terceiro dia começara com o seu coração confortado e seus pensamentos serenados. Estava feliz e seu semblante atenuado.
Seu terceiro dia não teve mais nenhum novo acontecimento. Apenas apareceram caminhos tortuosos, pedregosos e de vez em quando recortado por campos e florestas que desenhavam penumbras dançantes sob o sol escaldante. Não faltaram aqui e ali porções de penas a serem recolhidas. Decidiu não dormir ao relento quando chegasse a noite. Procurou um lugar para se abrigar, mesmo antes que chegasse a noite. Não encontrou. Ficou, entretanto, um pouco apreensivo até que de longe viu uma casa na beira do caminho onde para lá se dirigiu.
Chegando lá, ainda à tardinha, pediu abrigo, antes porém se identificando como um peregrino. As pessoas da casa lhe dissera que não poderiam abrigá-lo dentro de casa, pois teriam que fazer uma viagem antes que o sol aparecesse e, em razão deste fato não poderiam deixar ninguém dentro da casa. Ofereceram, entretanto, abrigo em um galpão celeiro onde os animais da pequena fazenda eram abrigados durante a noite. Os moradores lhe disseram, ainda, que no galpão ele encontraria três crianças, abrigadas ali temporariamente até de manhã quando seriam recolhidas por uma freira que as levariam ao convento para serem cuidadas como órfãos. Estava tudo arranjado de acordo com a vontade de todos. Pediu que o Milo não se preocupasse pois eram boas crianças apesar de não terem pais. Milo se apresentou às crianças que ficaram um pouco assustadas com a presença de um adulto entre elas. Milo tranquilizou-as contando-lhes histórias das grandes cidades do mundo todo. As crianças ficaram encantadas com as histórias e com o Milo. Dormiram como anjos.
De manhã cedo, como previsto, chegou a freira conduzindo uma carroça grande e velha com frutas, verduras, cereais e legumes doados pelos moradores da região. As crianças foram acomodadas ali no meio daquela fartura e antes de partirem Milo conversou com a freira: Madre! Pode me dar atenção por uns minutos? A freira respondeu: Sim meu filho!
Onde fica o seu convento ? A freira respondeu que se achava lá, depois da colina que apontara e, que era o abrigo de crianças órfão da guerra da Bósnia, onde recebiam todo cuidado possível e uma boa educação. E, que apesar de ser um convento pobre e viver de doações, todas as crianças eram bem recebidas e tratadas com muito afeto e carinho. Milo se identificou como um estrangeiro em peregrinação e que passaria em frente ao convento, pois o mesmo ficava ao lado da trilha na qual iria passar. A madre, muito gentil, lhe disse: Quer uma carona no meu meio de transporte? Milo vacilou, mas acabou aceitando e lá foram todos mal acomodados no meio às doações. Acostumado a viajar em carrões de luxo em estradas e ruas asfaltadas, mesmo a curtas distâncias, não escondia sua euforia e, junto com as crianças riam soltos ao ranger das rodas e no sacolejo do caminho pedregoso. Todos se divertiam, chegando a cantarolar junto com a freira. Chegando ao convento, Milo viu que se tratava de uma velha construção, o que restava de um velho forte militar destroçado por um bombardeio militar durante a guerra. Junto com as outras freiras e as inúmeras crianças que lá estavam, juntaram todos forças para colocar a carroça dentro do que restava do velho forte que a freira chamava de, “o meu convento”. Milo não pode esconder a sua desolação ao ver aquele lugar. Movido por um sentimento estranho ao seu comportamento normal, quase chorou de tristeza ao se lembrar das ruínas que vira em uma cidade da Síria. Preferiu não ficar ali por mais tempo, pois o lugar lhe abriam as feridas dolorosas da guerra. Enquanto as freias descarregavam as doações, Milo se recolheu a um canto e retirou da sua mochila, um talão de cheque que quase nunca usara antes e, preencheu uma folha com um certo valor. Assinou um outro papel, dobrou os dois e chamou a freira para lhe entregar. Insistiu junto à freira para desdobrá-los somente depois que ele tivesse partido. A freira surpresa com aquele gesto prontamente obedeceu. A seguir, Milo fez um pedido enfático à freira:

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Madre! Há duas crianças na vila próxima daqui que eu gostaria que a senhora recolhesse ao seu convento. Deu-lhe os nomes, acrescentando ainda: Quero também que a senhora entregue este outro papel ao gerente do banco local. Era uma maneira de melhorar as condições daquele lugar tão dilacerado, mas tão útil naquele momento.  Em seguida abraçou as crianças que conhecera no celeiro e se despediu de todos os presentes no convento. Partiu sob o olhar curioso e intrigado da freira. A madre ficou ali parada como uma estátua, hipnotizada com o perfil nobre e doce daquele moço até que o mesmo desapareceu na trilha dentro da floresta. Ela não sabia o que pensar sobre aquele ser misterioso.
Muito curiosa e apressada desdobrou o cheque e… Uau!!! Uau!!! Uau!!!… Não acreditava no que estava vendo!  O valor era de 100.000 Euros. Uma verdadeira fortuna para o convento. Um presente dos Céus!
A freira saiu correndo desenfreada, porém com cuidado, para recolher as duas meninas na vila próxima e ir ao banco.
Chegando à vila foi primeiro ao banco não acreditando no que tinha nas mãos. Consultou junto ao gerente do banco para ver se o cheque tinha valor e o documento era verdadeiro.  O gerente lhe disse que o cheque era verdadeiro só que o banco não tinha tanto dinheiro para entregar a freira. Recomendou que a mesma abrisse uma conta em nome do convento e fosse retirando o dinheiro aos pouco. Também lhe assegurou que o documento era autêntico e que continha uma autorização expressa para a transferência de um fundo em um banco de Nova York para o convento. A madre quase que enlouqueceu de tanta alegria. Depressa recolheu as crianças, que surpresas não entendiam o que acontecia. Obedeceram a madre  e seguiram para o convento.
As outras freiras do convento tiveram trabalho para conter a alegria da madre que cantava e dançava euforicamente. Ninguém estava acreditando naquele milagre.
Esse fora o acontecimento mais marcante do seu quarto dia. Havia mais um outro.
Percorrer a trilha dentro da densa floresta sobre a penumbra dançante das sombras vagando sobre o chão duro da subida da colina lhe abriu a perspectiva de que o dinheiro é um poderoso instrumento para produzir conforto, alegria, satisfação material e até mesmo espiritual. Mas é também um instrumento mortal que pode ser utilizado para o mal. Ao ser usado como pretexto para extravagâncias e apegos desenfreados acaba produzindo danos irreparáveis ao ser humano e ao meio em que vive. Acabara de se desfazer de quase tudo daquilo que sempre lhe proporcionara conforto. Porém, estava agora, mais confortável que dantes. Outra vez, penas e mais penas a serem recolhidas no caminho. Ao recolhê-las não esboçou nenhuma contrariedade. Pelo contrário, estava  mais leve agora, tanto quanto o feixe de penas que carregava.

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Ao deixar para trás o bosque que lhe produzira um entendimento melhor da importância de bom uso de recursos materiais, deparou-se, em frente, com um campo coberto de uma folhagem graminosa, verde e florida que lhe causou surpresa em meio a tantos terrenos desolados, secos e escarpados. A sua frente havia um banco de madeira ocupado parcialmente por uma mulher. Sentiu um certo aperto no coração e receio de passar em frente àquela criatura. Não teve como evitar. Ao emparelhá-la foi interpelado: Moço! Sente-se um pouco aqui! Milo respondeu: Não!  Tenho pressa! Pressa diante de um lugar tão lindo e deslumbrante como este? Completou a moça que por sinal era uma linda mulher. Por favor! Insistiu! Sente-se! Não tenha medo!
Milo não recusou ao pedido educado e se sentou ao lado da jovem. A moça perguntou ao Milo: O que faz aqui um jovem com um ar claro e evidente de estrangeiro? Ele respondeu que estava ali em peregrinação e completou: O que faz aqui, sozinha, uma jovem linda e sedutora como você? Estou aqui tentando sobreviver neste mundo tão injusto e infame! Completou.
Vendo meu corpo para poder sobreviver e alimentar minha família! Como assim, você não tem um companheiro, um marido, uma família? Perguntou curioso Milo! Ela respondeu que tinha um marido e era muito feliz com a família. Tinham uma bela casa com criados e um belo jardim verde como tudo isto que está aqui em nossa frente. Mas a insanidade dos homens com suas guerras imundas e seus gestos desprezíveis destruíram tudo. Levaram meu marido à força para a luta e ele morreu! Completou! Fiquei só e desamparada com duas crianças pequenas para criar. Neste instante, Milo cambaleou internamente como que atingido por uma punhalada e se levantou do banco querendo sair dali depressa. Estava ferido pela insensatez do mundo e foi prontamente contido pelo algo que invisível o acompanhava de perto. Ela foi incisiva e se ofereceu dizendo: Dê-me algum dinheiro e eu serei sua!  Milo foi sobressaltado pela ideia de que isto pudesse está acontecendo com sua ex-esposa lá nas ruas de Nova York. Foi um pensamento infeliz, extremamente doloroso, insano e cruel.
Colocou as mãos em todos os seus bolsos e locais onde pudesse está guardado mais algum dinheiro e, o que conseguiu colocou na mão da jovem e lhe disse: Vá para onde estão as suas crianças e não saia com mais ninguém por esta semana.
Saiu dali com os olhos cheios de lágrimas sob o olhar estupefato da jovem que nunca tivera um convite recusado. Andou por quase uma hora, desorientado e profundamente magoado pelo pensamento infeliz que fomentara sobre sua ex-esposa. Sentou no chão e chorou copiosamente. A voz que lhe era comum falou: Eu te quero aquele que fecha os olhos aos desvios dos caminhos e abre o coração com alegria às belezas luminosas das jornadas” . Alguém escreveu esta citação famosa em algum lugar.  Completou a voz!
Milo se levantou furioso e perguntou: Quem é, ou o que é você? Nada! Nenhuma resposta. Milo compreendeu que isto poderia fazer parte de toda a loucura que estava vivenciando.

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Andou mais um pouco e outra vez viu um monte de penas espalhadas pelo caminho e decidiu não mais recolhê-las. Ai a voz de novo interferiu dizendo: Coragem Milo! Recolha as penas! Ele respondeu que já estava farto desta loucura e que não mais recolheria nenhuma pena. Outra vez a voz: Coragem! Estamos perto do fim da sua jornada! Milo obedeceu resignado e recolheu as penas com um ar de desânimo.
Naquele quarto dia, a noite chegaria depressa  sem lhe dar direito, a chance do vislumbre de uma tarde luminosa e magnífica extravasada entre as encostas escarpadas das altas montanhas de Montenegro. Estava magoado e ferido na alma. Destroçado, cansado e com frio.
Recolheu-se debaixo de uma frondosa e florida árvore da região montanhosa ao vislumbre do dia ainda ensolarado e cheio de graça. Quando a noite chegou, dormiu sob um cenário celestial repleto de estrelas cintilantes, ajudado pela criatura invisível que compadecida lhe cobriu e corpo com cuidado de não tocá-lo. Não poderia tocá-lo de jeito nenhum antes da hora determinada.
Estamos agora no quinto dia. Logo pela manhã, ao acordar, estava mais animado depois de uma boa noite de sono, mesmo tendo dormido ao relento. Sempre, sempre dormira em camas aconchegantes e confortáveis, mas não sentia nenhuma falta do conforto do qual estava acostumado.
Estava passando por uma transformação muito profunda e, parecia se sentir mais confortado diante da jornada. Estava determinado a alcançar a Arbo Nu e isto era visível em seu semblante e no seu andar determinado. Sem compreender muito do que lhe acontecia, não sabia que estava, inconscientemente, à busca do iluminismo espiritual.
Para o Milo, era como buscar o Santo Graal. Olhou para cima e viu que o caminho a ser seguido ali mostrava perigo,  pois emparedava com um desfiladeiro alto e íngreme. Precisava ir devagar, com cuidado para vencer mais aquela etapa. Andou durante quase o dia todo.
Parou apenas algumas vezes para recolher penas e descansar os pés que mostravam sinais de fadiga. Fora lhe dito antes, pelo anfitrião que o alojou lá no início, que o sinal de que estaria perto de atingir a Arbo Nu seria uma subida em uma montanha alta rodeada em parte por uma floresta de pinheiros negros de um lado e do outro um vale que se fundia com o horizonte longínquo.
Era esse, sem dúvida, um lugar difícil a ser vencido.

 

Em um trecho da subida, passou por um caminho estreito com pedras bem colocadas no chão parecendo uma escada e tropeçou quase caindo para trás, mas conseguiu se segurar no galho de uma árvore, evitando um possível acidente.
Ficou um pouco irritado por estar sozinho e não ter com quem conversar. A sua companhia invisível não demonstrava nenhum sinal de que estava presente.
Finalmente atingiu o topo da montanha escarpada e ficou surpreso ao ver que o caminho terminara ali bem a sua frente diante de um precipício intransponível. Tinha quase certeza, desde o início, que alguém ou alguma coisa invisível o seguia à distância. Já tinha dado indício de sua presença. Esperou alguns instantes para ver se haveria alguma manifestação sobre o que havia diante de si e, nada. Apenas um silêncio cortante se fazia presente naquela altura. Não havia como seguir adiante. Estava desolado, pois parecia ter chegado ao fim, inutilmente.

A tarde se dispôs com toda uma exuberância de cores e indagações incríveis criando um cenário silencioso, espetacular para contemplação o que, de certa forma, dava um alívio a sua decepção. Sentou-se na borda de uma grande pedra que se projetava para o desfiladeiro e se entregou a um devaneio hipnotizante. Sentia-se privilegiado por estar ali tão longe dos centros urbanos que conhecera em toda a vida, mas perto de Algo Grandioso descortinado à frente.

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A mão celestial da noite foi rapidamente afastando a cortina espetacularmente iluminada da tarde, dando lugar ao aparecimento das primeiras estrelas chegando apressadas para exibiremos seus brilhos exuberantes. Não conhecera jamais, cenário tão espetacular e envolvente como aquele. Estava extasiado, de queixo caído e o coração e mente em festas. A grande oportunidade de sua vida para abrir em leque e refinar os seus conceitos sobre a existência humana frente ao cosmo estava ali aberta em  um convite irrecusável e único.  Tinha a certeza de que aquela era a sua última chance de ver um cenário tão espetacular como aquele.

Conhecia como ninguém os cenários astronômicos , pois era um aficionado pelo assunto e já estivera por diversas vezes em exposições da NASA sobre o tema. O portal da noite estava aberto e trazia junto uma lufada fria das brisas das alturas, o que fez com que ele se agasalhasse melhor para passar a noite.
Não queria de jeito nenhum perder aquele espetáculo que considerava um presente dos céus. Possuía um coeficiente mental invejável para engendrar pensamentos coesos e filosóficos. A primeira imagem que lhe chegou à mente foi a dos Pilares da Criação, a nebulosa espetacular e impactante da Águia. A altura dessas colunas é de dez anos luz, uma distância inimaginável para padrões normais.

Contemplou-a mentalmente e arquitetou o seguinte raciocínio: Quanta beleza existe em toda parte do universo.  Beleza essa fora do alcance visual dos humanos. Não pode existir apenas por acaso ou um  acidente. Existe por alguma razão que não a conhecemos ainda.
COMO PODE EXISTIR A MATÉRIA E COMO PODE A MATÉRIA CONTEMPLAR A PRÓPRIA MATÉRIA?
Imaginou então, um homem posicionado em pé ao lado de um ônibus e, ambos ao lado de um transatlântico. Imaginou-se subindo em um foguete e, a um quilômetro de altura não via o homem. A cinco de altura não via mais o ônibus e, a dez quilômetros não se via nem o navio.
Á medida que se afastava da Terra, as coisas iam ficando pequenas até desaparecerem por completo. Da lua não dá para ver nem entender como tudo na terra cabe ali naquela esfera azul. E o ser humano? Como é pequeno e insignificante!
Visto de Júpiter, a terra quase não pode ser vista. E, o sistema solar inteiro com todos os planetas não é visto das Colunas da Criação, a espetacular Nebulosa da Cabeça de Águia. A nossa galáxia inteira não é vista da nossa vizinha mais próxima que é Andrômeda.

Sabe-se que há no universo conhecido, bilhões e bilhões de galáxias como a nossa Via Láctea. E, tudo o que se pode imaginar é apenas uma minúscula parte do que há em todo o Universo.
Aqui surge uma questão que não tem solução e nem resposta: Como o ser humano é pequeno, apesar de toda a sua ousadia e arrogância! Sabe-se que no planeta Terra, apenas a espécie humana é capaz de um vislumbre cósmico. Somente o ser humano é capaz de se sentar em algum lugar à noite e contemplar as estrelas sem compreender quase nada do que está vendo. Por que somente ele, um tipo de matéria pode ter o privilégio de contemplar a matéria???.
A razão é que o ser humano, apesar de ser pequeno, ele é singular. Faz parte de Algo Grande! Incomensurável! Ele é pó das estrelas e faz parte delas que fazem parte de ALGO MAIOR, dentro de ALGO MAIOR ainda.
A resposta mais imediata, mais próxima de um entendimento é que, O SER HUMANO É IMORTAL! DIVINO!
E, por essa razão lhe é dado o privilégio de contemplar as estrelas, sentir-se parte delas e de todo o universo e, compreender que está envolvido na Essência do seu Doce Lar Divino. Exatamente como uma criança separada fisicamente da mãe ao nascer, percebe que  é parte de sua mãe em essência amorosa, do mesmo modo que a mãe percebe ser, também em essência amorosa, parte de seu filho ou filha.

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O braço crepuscular do amanhecer começara a rasgar, lá longe no horizonte infinito, a cortina chamuscada dos primeiros brilhos luminosos do novo dia. Algumas estrelas relutavam em apagar os seus brilhos ainda lúcidos e cintilantes.
Os primeiros raios do sol anunciavam o cenário abençoado e cheio de graça estendendo a mão em oferenda batismal.
Naquele instante, acabara de ser batizado pela própria Mão de Deus que lhe unge e lhe enche da graça maior de ver ruir o seu tão sólido castelo de ateísmo. Levantou naquela manhã abençoada com um semblante que deixava transparecer iluminação e muita serenidade e, respirou fundo. Acreditara agora na existência de um Criador para tão extensa e infinita obra cósmica. Um bater de palmas e uma expressão de elogio cortaram o silêncio da manhã: Bravo!!! Bravo!!! Bravo!!! Era a manifestação tão aguardada do algo ou alguém que o seguia há tempo. E, completou:
Olá! Chegou a hora de me apresentar!
Um redemoinho de luz se formou ali e dele surgiu uma criatura esbelta e lindíssima que de tanta beleza quase fez o Milo desmaiar de tanta estupefação.
Quem é você? O que é você? Por me seguiu até aqui? Com certeza também me trouxe até aqui!
Calma! Calma! Não fique receoso e não se sinta apressado! Tudo foi planejado para que você chegasse até onde está de forma segura. Tudo faz parte de um plano grandioso que envolve e envolverá muita ação.
Espere! Espere! Não me diga que toda a minha jornada termina aqui na beira deste precipício?
Não deste precipício, mas de um outro maior ainda!
Não Compreendo! Como outro precipício ainda maior?
Este ponto foi apenas para você refazer a sua postura conceitual! Ainda vamos andar junto por mais algum tempo. O ponto do término da sua jornada fica em um lugar próximo daqui. A Arbo Nu que você tanto desejou encontrá-la como uma pedra filosofal está mais adiante.
Completou o ser misterioso. Bem! Vamos até lá! Milo interrompeu insistindo: Espere! Antes, porém quero saber algumas coisas: Outra vez eu pergunto: Quem é você? O que é você? De onde você vem? Você não parece um anjo no aspecto angelical. Não tem um formato identificado como humano, apesar de parecer um ser humano de uma beleza fora do comum. O ser serenamente respondeu: Reúna as suas coisas e me siga! Milo pegou sua mochila, sua coberta enrolada, o feixe enorme de penas e obedeceu. O ser foi breve e deu as respostas ao Milo:
Eu sou Energia! Não tenho um formato definido! Posso, entretanto assumir qualquer forma em toda parte do Universo. O local de onde venho não pode ser definido como um lugar, mas um Estado que você não compreenderá. Esta é a primeira vez que me afasto do meu mundo. Estou aqui em uma missão que me foi designada por uma Ordem Superior! Não sou luz e nem sou trevas! Não sou do mundo dos vivos nem dos mortos! Não tenho nascimento e nem passo pela morte! Não tenho registro e nem memórias.
Sou Eterno! E, uma pequena parte de Algo Incomensuravelmente Grande e fora do entendimento de sua espécie. A minha missão junto a você e ao seu mundo é colher o que há de melhor em seu planeta e levar ao meu mundo para que outros da minha espécie possam semear onde houver vida sensível no cosmo.
O ser completou: Veja! O que importa em sua jornada é você! Não eu! Sou apenas o seu protetor e guardião, aquilo que vocês humanos chamam de anjo da guarda. Não tenho e não guardo memórias. Não precisamos disto onde vivemos. No entanto, algumas manifestações entre os de sua espécie me fascinaram e eu vou levá-las comigo, pois tem um conteúdo que precisa ser divulgado pelo cosmo! Você vai saber sobre o que me fascinou entre vocês!
A sua espécie teve um início muito doloroso e terá um fim, também muito doloroso. Foram muitas as etapas para que vocês chegassem onde estão hoje. Vocês foram semeados aqui na terra por uma espécie muito antiga e, que está no topo da Hierarquia Espiritual. Foram muitas as tentativas para aperfeiçoar o seu DNA biológico e introduzi-lo em um tipo de hominídeo que melhor atendesse aos moldes da evolução neste planeta. No princípio era o homem das cavernas com as mesmas características dos demais animais da terra. As espécies das estrelas que aqui estiveram produziram modificações no DNA biológico destas criaturas e procuraram aperfeiçoá-lo para incorporar um outro DNA muito valioso ainda que é o DNA Emocional. Os primeiros seres humanos precisavam deste DNA Emocional para receber os primeiros espíritos enviados das estrelas num processo de transmutação espiritual cósmica muito comum em todo o universo. No mundo material em que vocês vivem e se desenvolvem não pode haver angelização, pois este é um mundo de expiação que é comparável a um campo de batalha onde a competição, o sofrimento e a hostilidade prevalecem o tempo todo. É entendido, também como um caminho em um campo por onde o espírito passa para ser melhorado, processo este muito difícil de ser alcançado. O DNA Emocional humano tem muitas propriedades magníficas e valiosas que lhes ajuda nas tarefas mais difíceis. As manifestações deste DNA Emocional nos campos da alegria, da solidariedade e da paz são deveras valiosas. Valiosos também são as qualidades oriundas destas manifestações ligadas ao AMOR, a FÉ, a ESPERANÇA, a CARIDADE,  a COMPAIXÃO e outras. São manifestações belíssimas para o espírito humano, pois dão conforto e abrem horizontes para uma travessia espiritual mais amena e suave. Este é o grande tesouro, o legado da sua espécie para a posteridade cósmica. Há, entretanto, sombras e trevas a moldar arduamente a travessia humana. São as manifestações deste mesmo DNA que produzem medos, angústias, raiva, ódio, desorientação, solidão, fracassos, vontade ferrenha e inconsequente de fazer guerra, exterminar o outro, destruir o próprio meio em que vive e, o pior de tudo, um dia levar sua ira às estrelas. A evolução humana no campo do material não tem limite e não encontra fronteiras. No entanto a espécie humana sofre na dor, padece de males e doenças incuráveis e, contagiosas sem saber como lidar com elas. A sua espécie ainda é selvagem e navega nos mares da hostilidade sem saber fazer uso dos atributos benéficos que o seu próprio DNA EMOCIONAL tem a lhe oferecer. Curam-se duas doenças, aparecem outras quatro. Maquiem-se as rugas, mas não escondem a velhice. Acumulam-se fortunas, mas hesitam em distribuí-las. Dizem-se seguidores do Grande Mestre que esteve entre vocês, mas se lhe baterem à face, não oferecem a outra. Em vez disso, deixam transparecer a fúria adormecida e empunham a espada em represália. São doenças incuráveis na falta das qualidades maiores que receberam dos Céus. Sucumbem na dor junto com o espírito ferido. Não percebem que o mais importante é conduzir na travessia da vida, o espírito em glória para a Eternidade. Podem se curar! Só não sabem como!
Bem! O que eu tinha de falar já o fiz e agora vamos continuar com a jornada, pois também faço parte dela! Milo percebeu que o ser mantinha uma certa distância dele e isso lhe provocou curiosidade a ponto de interferir:

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Você tem um nome para que eu possa me dirigir? O ser respondeu: Não! Não tenho nome, mas você pode criar um para mim!  Milo resolveu chamá-lo de Gillius, pois este nome lhe chamou a atenção quando o ouviu pela primeira vez.
Milo – É muito curiosa a situação em que me encontro! Fui levado a fazer uma peregrinação como tantas outras feitas pelas pessoas comuns, mas não esperava passar pelo que estou passando. É tudo surreal e estou tendo dificuldade em acreditar que tudo isto seja verdade. Parece mais um tipo de sonho, daqueles sonhos que depois de acontecidos, nunca mais nos esquecemos deles. Mas o que me perturba agora é essa distância que você mantém de mim, por quê?
Gillius – Tudo!  Mas tudo mesmo é um sonho. Às vezes um sonho belo ou um sonho ruim. Só que o sonho que você está vivendo é um sonho magnífico e glorioso. Com relação a distancia que mantenho de você é para sua segurança, pois a jornada é importante e, isto é necessário.
Milo ficou em silêncio e não retrucou.
Milo – Tudo foi se encaixando dentro de um programa onde as minhas qualidades ocultas, circunstancialmente, foram se revelando sem que eu as provocasse. Tudo se acomodou perfeitamente desde o começo. O anfitrião que parecia está me esperando e que já me conhecera; a moça do banco que tivera um desenrolar feliz juntamente com suas irmãs; as crianças lá no celeiro da estrada; ah, a freira, doce freira Bernadeth e por fim a linda senhora que eu a encontrei na estrada. Bem!  Tudo foi cheio de surpresas para mim. Sou uma pessoa das grandes cidades e das sociedades elevadas, acostumado à efervescência social diurna e noturna, reuniões de negócios, coqtaills, salas de concerto e muitas viagens, mas nada, nada mesmo foi tão marcante como esta jornada onde tudo foi acontecendo da forma mais surpreendente possível. Foi mesmo uma bela jornada! Só não sei como vai terminá-la.
GilliusNão importa o invólucro, o que importa mesmo é o coração. E, você tem um belo coração. Sempre teve, por esta razão é que você está aqui. Esta sua jornada será conhecida. Garanto!
Enquanto conversavam, a caminhada continuava até que, Gillius que andava na frente a uma certa distância parou e disse: Milo, chegamos ao primeiro platô e, aqui começaremos alguns rituais.
Ponha no chão o feixe de penas e, espalhe-as separando-as pelos tamanhos e formatos. As penas que estiverem quebradas, danificadas e mesmo chamuscadas, deixe-as separadas, pois elas não servem.
Assim fez o Milo. Separou-as conforme lhe fora orientado.
Como num passe de mágica, Gillius fez surgir um suporte de um par de asas e orientou Milo a encaixar nele todas as penas perfeitas e limpas. Milo começou a montar o par de asas, desconfiado de que essa era a função das penas desde o início: Montar um par de asas! Milo pensou: Isto é terrível! Eu nunca montei um par de asas antes. Não foi difícil e logo estava pronto o par de asas.
Gillius pediu ao Milo que encaixasse as asas e ajustasse ao seu corpo. Milo assim o fez, mas em seguida retirou as asas e as colocou no chão, interpelando o Gillius com um ar de reprovação e indignação dizendo: Espere aí, Gillius: Tem coisas que você precisa me esclarecer:
Por que eu tive de recolher, nos caminhos por onde passei, todas estas penas com orientação de não deixar nenhuma para trás?
Gillius respondeu com serenidade: Eu tinha que falar a você sobre estas penas e a finalidade delas. A função não é só para fazer o par de asas.
Há uma razão maior e muito mais importante: Veja, todas as criaturas humanas em algum momento de suas vidas vão precisar de um meio para fazer esta travessia. Todas irão se deparar um dia com uma Arbo Nu que se encontra na fronteira entre o mundo material e o não material. Neste momento, o par de asas será vital para a travessia sobre a ponte até o outro lado. Apontou, então para as penas ali no chão dizendo:
Gillius – Eu orientei você a montar estas asas com apenas uma pequena parte das penas que você trouxe. As penas destas asas são especiais e representam as qualidades virtuosas de sua pessoa. Aqui estão, a moral, a ética, a dignidade, a honestidade, a decência, o amor, a compaixão, a caridade, a solidariedade, a responsabilidade para consigo mesmo e para com os outros, e muitas outras virtudes. Isto é valioso e constitui a sua bagagem para a viagem. É leve feito plumas e fará você voar para o outro lado.  Há, entretanto, outras penas ali no chão que formaram outras asas sem nenhuma utilidade, pois são as penas do apego material, do egoísmo, da indecência, da imoralidade, do ódio, da raiva e de todas as maldades do coração humano. Não servem para nada. Pois, ninguém flutua com elas. Cada um que chega até a sua Arbo Nu com poucas penas virtuosas, mas com muitas dessas penas que representam a maldade, ao se atirarem no vazio para a travessia não flutuam e acabam caindo ou de volta ao seu mundo material de origem para começar tudo de novo, ou a outros mundos ainda mais abaixo. Isto é muito ruim para elas, pois estarão sujeitas a muitas outras vidas presos aos apegos e conseqüentemente a todo tipo de sofrimentos e dores. Isto é um grande desperdício na trajetória espiritual.
Milo perguntou ao Gillius: Onde se encontra a Arbo Nu de cada ser humano?
Gillius respondeu: Siga-me por mais um pouco e você verá a Arbo Nu. Antes, porém, deixe aqui a sua mochila, seu calçado e tudo o mais. Diante da Arbo Nu não deverá haver nada que esteja ligado ao mundo material.
Assim fez o Milo. Andaram por mais alguns instantes até que chegaram à borda de um outro platô elevado que descortinava um lugar muito alto com uma visão longínqua coberta por um nevoeiro denso que cobria um grande precipício. La chegando, a surpresa: Disse Gillius: Chegamos Milo e aí está a Arbo Nu!

Milo –  O que? Uma árvore? Uma velha árvore? além de velha, retorcida e corcunda! Isto  é a Arbo Nu?
Sim! Respondeu com precisão Gillius!
Milo –  Alem do mais é uma árvore toda enrugada parecendo um ser humano velho e, não há terra aqui, apenas um rochedo ressequido sem vida!
Gillius: É isso mesmo! Este é o limite entre o mundo material e o não material.
Dito isto, Milo compreendeu que estava, de fato, envolvido em uma Jornada Espiritual sem volta ao seu mundo material. Não se surpreendeu, pois tudo levava a crer que todo o enredo já estava traçado desde o início da jornada.
Milo –  Você me disse que a Arbo Nu representa o ser humano no momento em que é feita a tentativa da travessia para o outro lado. Mas, esta Arbo Nu é velha e não representa a minha pessoa em vida, pois não sou velho! Como explica isto?

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Gillius – Boa observação Milo! Esta Arbo Nu não representa você! Ela é um tributo a um feito extraordinário entre os de sua espécie: Os maiores Heróis e Heroínas da espécie humana: Os idosos! São os pais e os avós em vida. Seus, de seus outros parentes. De seus amigos e vizinhos. Conhecidos e desconhecidos, próximos e distantes espalhados pelo mundo todo. São as maiores expressões de vida de sua espécie. São os sobreviventes de uma dolorosa e áspera trajetória de vida. É um feito de vida notável e glorioso chagar à velhice diante de um mundo tão hostil e perigoso como é o seu mundo.
É uma grande pena, pois não têm o reconhecimento, a admiração e o respeito de grande parte dos humanos. Os seres humanos são muito frágeis, ingênuos e inconsequentes e, chegar à última idade é um feito extraordinário. Esta é a razão desta Arbo Nu aqui. Ela não representa você. Ela é um tributo elevado ao ser humano que chega a este nível de existência. Sobreviver aos processos de vida como a pobreza, as injustiças sociais, os perigos da natureza, os acidentes, os vários tipos de abandonos e principalmente as doenças e enfermidades, tudo isto é um feito notável, digno de reverência inegável.
Milo sentiu um alívio, mas não escondeu sua curiosidade em saber por que ela estava ali naquele lugar estéril.

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Gillius respondeu: Milo, você precisa ter a consciência clara desta visão, pois ela será repassada através de suas memórias das quais eu serei o emissário e portador. Ela está aqui porque representa a maior proeza dos seres humanos. Você deve ter notado que a copa das folhas é viçosa e verdejante, pois deve representar a expressão maior da espiritualidade, da maturidade e da essência do que é valioso e divino em cada ser humano. O fato de estar na beira deste penhasco é porque representa o perigo constante que há na vida.

Milo ficou encantado com o que ouvira de Gillius. Estava, entretanto, ciente de ser, ainda, dono de sua própria orientação e tomou uma decisão: Voltou até o local onde estava o par de asas que montara com a ajuda do Gillius e, diante do olhar surpreso deste começou a desmontá-la. Juntou as penas em um feixe e, depois voltou até a borda do platô onde estava a Arbo Nu e as atirou pena por pena nas profundezas do precipício enevoado.

 

Gillius não o impediu, mas externou sua desaprovação veementemente dizendo: Milo, por que você fez isto? Este par de asas era para a sua travessia deste lado para o outro. E agora?
Milo: Como posso eu fazer a minha travessia para o outro lado, usando as penas definidas como virtuosas, sabendo que lá embaixo, muitas vidas precisam destas penas do bem? Neste instante, uma primeira lágrima brotou dos olhos de Gillius que procurou disfarçadamente escondê-la. Ficou comovido por mais um gesto deste ser humano especial do qual era o guardião com muito orgulho. Gillius pensou: Bem, ele pensou nos outros e agiu em benefício dos outros. É uma grande alma. Um Mahatma! Lembrou-se de um outro grande líder espiritual que passou entre os humanos: Buda! “ Eu ficarei aqui de vigília, orando até que a última alma humana consiga fazer a travessia com segurança. Só depois, então, eu farei a minha travessia.” Isto é compaixão!
O suposto mal estar entre os dois que, na verdade não fora um mal estar, estava desfeito e o Milo dirigiu a palavra a Gillius dizendo: Gillius: Você me disse que não poderíamos chegar até aqui onde está a Arbo Nu trazendo algo que tivesse ligação com o mundo material e, no entanto, você tem aí uma mochila que não se afastou dela nem por um segundo! O que tem dentro dela?

Gillius respondeu: Bem, esta é a última chance para você fazer a sua travessia. Abriu a mochila e, como num passe de mágica retirou dela um esplendoroso par de asas dourado como o sol da tarde em um cenário oceânico  e, a uma certa distância entregou ao Milo dizendo: Milo eu guardei estas asas sabendo o que você ia fazer com a primeira. Use-a, pois elas vieram do Alto como uma alternativa  especial para você.
Milo colocou-as nos ombros e se dirigiu até a borda do platô e, olhou lá do alto para o precipício que se abria sem fim diante dos seus pés. Recuou, colocando as asas no chão e, começou a desmontá-las como da outra vez sob o olhar atônito de Gillius e, jogou as penas lá embaixo, uma a uma.

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Desta vez o Gillus estava desarmado e não disse nada. Milo sabia que as penas eram mais úteis lá embaixo junto às almas onde a carência de graças era quase infinita. Dirigiu-se até o Gillius e disse o seguinte: Durante toda a minha vida eu sonhei que voava quase todas as noites e nunca precisei de asas. Sempre acreditei que era possível voar e assim fui agraciado em voar sem asas e, não será agora que vou precisar de uma.
Gillius se aproximou de Milo e rompeu o mistério do distanciamento.
Milo, eu fui enviado ao seu mundo com a missão de protegê-lo até aqui. O pouco tempo que passei com você desde o nosso primeiro encontro fui surpreendido com todo o conteúdo das suas memórias. Fiquei decepcionado com o que você vivenciou, circunstancialmente, mas fiquei maravilhado com o que presenciei junto a você, ligado a você, especificamente. Este seu último gesto culminou como uma lembrança eterna que terei de você.
Dito isto, Gillius abraçou o Milo e eis o que aconteceu: Milo sentiu uma descompressão sacudir por inteiro todo o seu corpo, deixando porém, uma leveza suave e serena inundar toda a sua alma. Naquele instante ao abraçar o Milo, Gillius retirou dele toda a proteção contra as toxinas venenosas e mortais da picada da serpente, lá atrás no início da jornada. Milo não viu as marcas da picada da serpente na ocasião e também não sentiu a mordida porque estas se misturaram com os ferimentos ao cair no chão. Durante todo o trajeto da jornada, as toxinas venenosas da serpente ficaram isoladas pela ação providencial do Gillius.
Havia chegado a hora da partida e aquele gesto do Gillius era necessário.
O corpo de Milo jaz ali na rocha estéril sem que este o veja, pois já estava do outro lado. Neste instante a Arbo Nu, tributo aos heróis e heroínas desaparece e em seu lugar surge uma Arbo Nu jovem e robusta e, mais surpreendente ainda, cintilante e inundando todo o platô de um dourado que resplandecia até entre as nuvens ali próximas. Era a Arbo Nu do Milo, aquilo que representava em essência aquele ser com o coração tão cheio de bondades.
Estava prestes a partir para a última jornada e, o Gillius relatou e fez as ultimas recomendações:
Milo, aqui nos separamos. Não posso continuar mais com você, pois daqui em diante você adentrará no seu mundo espiritual que é diferente do meu. Este seu novo mundo é o lar definitivo de todos aqueles que atingiram um grau de evolução espiritual que o coloca em uma outra jornada a mundos mais elevados ainda. Nossos mundos espirituais são muito diferentes, mas fazemos parte, todos, do mesmo universo de Deus que é parte de outros e mais outros. É tudo muito complexo para o entendimento da alma humana. Tudo se resume a infinitas pequenas bolhas universos, tanto físicas como espirituais dentro de infinitas bolhas universos maiores, também físicas e espirituais dentro de outras bolhas universos ainda maiores e maiores. Todas estas grandezas representam Deus que está contido em um minúsculo espaço rodeado de Amor e Compaixão que é: O Coração Humano.
Milo,  quero tranquilizá-lo ainda sobre os eventos da sua jornada: A jovem do banco, lá atrás, foi acolhida pela sua querida amiga da capital e, em muito breve vai se juntar com suas irmãs pequenas onde todas reunidas formarão uma grande associação de empresas de moda dando emprego a muitas pessoas em várias partes do mundo. Serão todas muito felizes em suas jornadas pela vida.
A freira Bernadeth vai fazer um bom uso dos recursos que você doou, para montar um grande hospital e um exuberante convento nas encostas montanhosas de Montenegro. As crianças que você encontrou lá no celeiro se juntarão às meninas irmãs da jovem do banco para a formação da grande sociedade empresarial.
A linda moça que você encontrou por último e, que vendia o corpo para não deixar morrer de fome seus filhos pequenos, logo que você a deixou, ela se encontrou com o seu antigo amor de juventude, que a protegerá e a amará, juntos com as crianças. Serão também felizes em suas jornadas pela vida.
Ah! A freira Bernadeth! Seus últimos pensamentos em vida serão orientados a JESUS e a você. Ela nunca se esquecerá de você.
Milo, suas obras de bondade, de puro coração se multiplicarão em benefícios de muitas vidas carentes no seio da espécie humana.
Bem! Chegou a sua hora de partir!
Está pronto meu amigo? Boa viagem e que DEUS o acompanhe! Adeus!

 

Gillius ficou no platô com os olhos cheios de lágrimas, contagiado por um tipo de emoção que nunca conhecera antes. Era o Amor Universal que aprendera com o Milo. Fora uma experiência notável e inesquecível que tivera junto com uma criatura humana, cuja alma fora uma dádiva valiosa e gloriosa de Deus neste planeta.

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Milo se atira ao precipício e… Flutua!  Flutua suavemente em meio ao nevoeiro que parecia, agora, mais branco que antes e que se dissolve ao vislumbre emoldurado de paz em profusão sobre campos verdes, montanhas, lagos, rios e mares. Uau! Uau! Uau! Igualzinho aos meus sonhos! Era a última visão do seu mundo.
Agora partia em profunda paz sobre as ondas da serenidade, mergulhado no infindável oceano do  Amor Universal.
Estou em um estado de graça perpétuo!
Nada é tão completo e extensivo como estar neste divino e glorioso momento de beleza eterna!
Minhas últimas memórias humanas estão se desfazendo como poeira atirada ao vento!
Sou o pó das estrelas e para elas retorno triunfalmente!
Agora é minha alma que se desfaz como fina areia flutuante levada pelo vento e pelas águas serenas do mar de minha infância!
Estou atravessando a grande cortina e me desfazendo por completo!
Incorporo-me ao Divino em Luz e Liberdade Eterna!  Mas!… O que é isto??? Oh! DEUS!!!!!!!!!……

 
 
 
Em uma das altas montanhas de Montenegro existem duas estátuas de pedras, enegrecidas pela ação do tempo.
Uma delas está de pé com os olhos fixos e penetrantes no horizonte azul longínquo.
A outra está sentada em posição de lótus e, em profundo estado meditativo.
Não se sabe como estas estátuas chegaram até o alto da montanha e nem quem as colocou lá.

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Os Heróis e Heroínas da Raça Humana.

Tributo enaltecido com elevado grau de reconhecimento.

 

Poema: Cem vezes.

BELOVED  ONES (amados)

Não importa que as portas das tuas casas sejam de madeiras nobres ou mesmo que sejam de restos velhos ou retalhos recolhidos em lixões e entulhos. Não importa nem mesmo que sejam de panos ou de plásticos.
O que importa é saber que, ao abrires as tuas portas, desnudando tuas intimidades, tuas vidas e teus caráteres, eu vou ver em todos os teus rostos, claros traços de bravura, de doçura, de destemor e, com pesar, até mesmo de clamor e de dor.

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Cem vezes tivestes que semear alegria.
Cem vezes tivestes que colher tristeza.
Cem vezes tivestes que semear conforto.
Cem vezes tivestes que colher lágrimas e dores.
Cem vezes minha vida inteira na face.
Cem vezes escondi meu rosto molhado de lágrimas.
Cem vezes enxuguei minhas mãos molhadas de lágrimas.
Cem vezes os teus olhares foram  de ternura.
Cem vezes os teus rostos não escondiam amargura.
Cem vezes olhastes com doçura.
Cem vezes cometestes erros.
Cem vezes pedistes desculpas.
 Cem vezes estampastes compostura.
Cem vezes fostes magoados.
Cem vezes não fostes confortados.
Cem vezes estivestes na solidão.
Cem vezes não tivestes companhia.
Cem vezes sorristes ao usares tuas jóias.
Cem vezes chorastes por não teres nem ouro nem prata.
Cem vezes derramastes lágrimas silenciosas.
Cem vezes exaltastes tuas alegrias pela metade.
Cem vezes teus olhos estiveram abertos.
Cem vezes teus ouvidos estiveram despertos.
Cem vezes teus vizinhos foram os penedos.
Cem vezes ninguém te visitou senão os mochos e morcegos.
Cem vezes tuas angústias foram silenciosas.
Cem vezes teus clamores foram mais altos que as trombetas.
Cem vezes tuas sabedorias serão exaltadas.
Cem vezes tuas experiências serão abraçadas.
Cem vezes teus rostos enrugados mostraram serenidade.
Cem vezes teus olhares não escondiam inquietudes.
Cem vezes fostes amados.
Cem vezes  fostes colocados de lado.
Cem vezes fostes abraçados.
Cem vezes fostes presenteados.
Cem vezes fostes agraciados.
Cem vezes fostes exaltados.
Cem vezes fostes esbofeteados.
Cem vezes recebestes teus amados.
Cem vezes tivestes desagravos.
Cem vezes serás considerados heróis.
Cem vezes estareis na galeria dos mais bravos.
Cem vezes estareis com Deus.
Cem vezes sereis lembrados como BELOVED  ONES (Amados).
Pi-Nath

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